quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Even Better Than The Real Thing

Fazia exactamente 3 anos desde aquele dia memorável. Aquela semana tão stressante e empolgante que deu a passagem para o momento mais surreal e erótico da minha vida. Lembro-me como se fosse ontem. E eu não estou a usar este cliché por acaso, lembro-me mesmo de tudo até ao mais pequeno pormenor. Também, era difícil não lembrar, não é? Todos os dias tiro uma parte do meu dia para reflectir e dar asas à minha memória… nunca fui boa nisso, mas neste caso aquelas imagens alojaram-se na minha cabeça como uma melodia muito gasta e quando havia silêncio absoluto em mim, lá voltavam elas. Naquela altura, o estádio do Barcelona transformou-se na minha casa, era o meu lugar, e não iria sair de lá enquanto não assistisse ao tão esperado concerto. Quatro dias passei eu e mais centenas de fãs esperando para que tal acontecesse. Noites sem dormir, o difícil acesso às casas de banho, o calor e a ansiedade que aumentava hora após hora. Mesmo por cima das nossas cabeças, preso com fita-cola nas pareces de inox do estádio prendia-se uma bandeira de três cores listadas: Verde, branco e laranja onde se podia ler em letras pretas e gordas: U2. Eu não estava lá para ouvir U2. Não apenas isso. Eu não queria sair de lá a pensar que milhões de pessoas já o tinham visto em outros sítios distantes do planeta… não era essa a minha intenção! Eu queria algo mais. Queria sentir que tudo aquilo se revoltava contra tudo o que eu havia pensado antes! Queria uma lição de vida! Queria que as quatro paredes à minha volta se desmoronassem e que abrissem uma passagem para um mundo à parte. Eu queria na verdade, sentir os U2 a entrarem no meu coração, como nunca antes fizeram. E foi isso que aconteceu, mas duma maneira que eu não estava à espera!

Charlie insistiu na campainha mais uma vez. Natasha segurava dificilmente duas malas em ambas as mãos, e eu esperava desesperada por um sítio minimamente quente. Tínhamos acabado de chegar a Dublin e esperávamos que Tom nos abrisse a porta da sua casinha simpática. Bom, será importante recordar que tinham passado 3 anos após o concerto, por isso estávamos nada mais nada menos que em 2004. É necessário também dizer que encontrámo-nos no mês de Novembro, por isso tenham a noção que eu estava congelada da pele até aos ossos.
- Porra, porque é que ele não abre a porta? – Pergunto cruzando os braços tremendo por todos os lados.
Será necessário uma personagem dizer o meu nome para que depois de lerem a minha história me possam abordar na rua e chamar-me de ordinária sem jeito?
- Achas que eu sei, Joanne?
Sim… Obrigada, Charlie! O meu nome é Joanne Silver e tenho 21 anos. É… à cerca de 3 anos atrás tinha 18, mas isso não é relevante agora! Estudo na Faculdade de Letras da Universidade do Porto e estou no segundo ano. Enfim…
- Ele deve ter saído para comprar o nosso jantar ou assim! – Completa Charlie.
A mim pareceu-me ouvir alguns passos lá dentro, mas pensei que fosse alguma espécie de miragem causada pelo frio. É então que as minhas amigas olham uma para a outra e de seguida para mim. Sim, era mesmo o Tom!
- Hello my girls! – Falou ele no seu sotaque irlandês que eu tanto adoro!
Tom estava do outro lado da porta a sorrir para nós de braços abertos.
- Hey! – Exclamou Charlie explodindo de alegria ao ver o seu velho amigo. Lançaram-se num abraço tão apertado que o frio quase me passou, mas a ver pelo tempo que demorou estive quase para protestar.
Charlie entrou pela casa dentro enquanto eu e Natasha cumprimentávamos Tom da mesma maneira calorosa.
Estávamos por fim dentro da sua casa. Charlie passeava pela sala de estar despindo o casaco e eu e Natasha pousamos as malas junto às escadas. Tom apressou-se a ajudar-nos nessa tarefa com um largo sorriso estampado na cara.
- Fizeram boa viagem? – Perguntou-nos ele no mesmo sotaque irresistível.
- Sim! – Respondemos em coro.
- Tens uma casa linda! Muito bem decorada… parabéns! – Disse Charlie admirando a o tapete branco do hall.
- É, dizes sempre isso quando cá vens!
Rimo-nos os três enquanto Charlie se explicava um tanto embaraçada.

O seu toque era delicado e a voz profunda que ecoou nos meus ouvidos clara e concisa. Talvez no momento não o tenha percebido, estava tão perto de mim! Num vai e vem de movimentos loucos rolando pelo chão eu só ouvia o inferno das pessoas na plateia a assistir a tal cenário. Vi as minhas amigas a acenar e a sorrir enquanto Bono me puxava e deitava por cima dele. Não sei o que senti naquele momento, parecia que estava num sonho, e não sabia se bom ou mau. Só umas horas mais tarde, depois de me devolver de novo ao grupo de pessoas eufóricas lá em baixo eu dei-me conta da medonha realidade que me olhou com um olhar comprometedor até hoje. Eu tinha subido ao palco e tinha-me envolvido numa coboiada tremenda com o vocalista dos U2!!
Bom, esta foi a continuação do meu sonho tornado realidade. E foi assim que terminou. Em Setembro de 2001 durante o concerto da Elevation tour eu fui escolhida no meio daquela multidão. Eu trazia uma rosa vermelha a minha intenção era que o Bono ficasse com ela. Quando passou perto da nossa zona cantando The Fly tentei com que ele a visse lá no meio de braços estendidos, mas ele percebeu mal… Pegou nela rindo-se e colocou-a na sua boca (eu tive o cuidado de tirar os espinhos…) e estendeu-me a mão para eu subir. Foi o que foi… Eu queria uma lição de vida? Ele deu-ma! Aprendi realmente o que era ficar enrolada no meio das suas pernas!
Ouço alguém a bater à porta no meu quarto.
- Joanne, o jantar está na mesa para se comer, vens?! – Era Natasha.
- Sim! – Respondi fechando o livro.

O jantar estava bastante bom. Isso surpreendeu-me pelo facto de ter sido feito por um homem. Bom, não estou a rebaixar as possíveis capacidades de culinária dos homens, mas, bom, na idade do Tom esse dom não era um dos requisitos pedidos.
- Bom, minha queridas, o que pretendem fazer agora? – Pergunta Tom levantando-se da mesa.
O que eu pretendo fazer agora é muito simples. Pretendo regressar ao passado, consegues, meu amor?
- Hum… não sei, podíamos ir dar uma volta. – Sugere Charlie.
- Podia ser que encontrássemos o amado da Joanne à muito desaparecido, não era? Depois daquela noite não deu notícias! Não telefonou… nem escreveu! Enfim… Que tristeza!
Todos olharam para mim com ar de riso. Natasha pousou silenciosamente o copo de vinho em cima da mesa. Eu sorri que nem uma parva e mordi o lábio inferior lembrando-me do concerto outra vez.
- Bem, podíamos dar uma escapadinha até aos estúdios! – Diz Charlie quebrando o silêncio.
- Os milagres não existem, meninas. – Diz Tom. – Vocês querem encontrar os U2 a esta hora? Não vai ser no locar de trabalho deles…
- Sim, devíamos ir lá amanha de manhã.
Mas o que é isto? Eu é que sou a fã de U2 aqui, eu é que gatinhei no colo do Bono e eu é que fui ao concerto deles, porque estão tão empolgados em vê-los, agora?
- Hum, tenho um bom pressentimento! – Disse eu. – Podemos passar apenas por lá?
- Claro! Mais tarde vou-me encontrar com uns amigos meus, mas acho que dá. – Concordou Tom. Reparei que não parecia com muita vontade em ir para o subúrbio agora, mas depois regressaríamos rapidamente.
- Então temos de ir rápido! – Exclamou Charlie levantando-se.
Reparei que Natasha ainda me olhava e sorria ao ver-me levantar cheia de vontade. Agora piscou-me o olho. Ora bolas!

A noite estava gelada mas serena. Eu trazia a minha máquina fotográfica no bolso do casaco caso fosse preciso… Tom conduzia no seu audi bem ‘modestinho’ enquanto eu acompanhava Natasha no banco de trás. Eram oito e meia quando chegamos perto dos estúdios Hanover Quay. A rua estava completamente deserta.
Não era a primeira vez que eu entrava ali. Lembro-me bastante bem de quando tinha 14 anos e ganhei uma viajem à Irlanda. Havia sido a primeira vez que pisava terras irlandesas. Visitei tudo o que era lugar mas não vi U2 em parte alguma, e na altura já era bem fã!! Bem ou mal, eu estava cá outra vez, será que iria ter essa sorte? Oh, cala-te Joanne, sorte foi à 3 anos atrás e isso não se voltará a repetir nunca!
- Olha, está ali um carro! – Disse Charlie no lugar da frente apontando.
Os faróis ofuscaram-nos a vista pois o carro vinha na nossa frente, mas num instante o podemos ver com mais nitidez.
- É um Mercedes verde! – Disse Tom.
- E bem antigo, ‘xiça’! – Exclamou Charlie ao espreitar pela janela do carro.
- Mercedes verde e modelo antigo? – Perguntei eu debruçando-me para a frente.
- Hum. – Assentiu ela.
- Uau… - Estava perplexa – Deve ser o Edge!
Ambos olharam para mim como se me fossem comer. Senti Natasha a sair do carro batendo a porta com força.
- Merda! Tá’ um gelo! – Ouvi ela a protestar lá fora enquanto andava em direcção ao carro que abrandava lentamente.
Charlie, Tom e eu fizemos o mesmo.
Os meus amigos sorriam abertamente enquanto Edge nos recebia dentro de um casaco bem apertado. Eu nem queria acreditar! Estava novamente mergulhada num sonho.
Tom falou sem medo. – Edge, estas fãs vieram de Portugal… Elas querem uma fotografia!
- Posso tirar-lhe uma fotografia? Se não houver incómodo, claro! – Falei incrivelmente sem tremer a voz, o que foi óptimo!
- Sem dúvida! – Respondeu ele.
Tirei a máquina do meu bolso e prontifiquei-a. Edge fez uma pose com o polegar para cima e um sorriso largo. Eu só sabia pensar o quão bizarro era ver o guitarrista da minha banda preferida dentro da minha máquina fotográfica! E mais bizarro foi tirar a fotografia a ele fazendo pose para mim… Mas foi uma experiência totalmente electrizante!
- Muito obrigada! – Disse eu fazendo o maior sorriso do mundo.
Tom tirou-me a máquina das mãos e disse a sorrir para o Edge. – Agora só com ela!
- Ok. – Disse ele apenas.
Fiz sinal para as outras se juntarem a nós. Edge colocou os braços à volta do meu pescoço, no de Charlie também e Natasha ficou justamente ao meu lado. Sorrimos os quatro iluminados pelo flash da minha máquina. Aquilo era fantástico, se dependesse de mim ficaria toda a noite naquilo! Mas enfim, Edge teria certamente “mais que fazer”!
Olhamos felizes umas para as outras enquanto ele nos apertava as mãos delicadamente despedindo-se.
- Muito obrigada, Edge por tudo! Pela música, pelo seu desempenho na banda… e por este momento! – Estas foram as palavras que sempre desejei dizer a um membro de U2 quando tivesse a oportunidade. O meu desejo é nunca mais parar esta conversa, mas Edge apressou-se.
- Ah, obrigada nós pelo vosso carinho e admiração. Não seríamos nada se não fossem os fãs, não é verdade! Bem, foi um prazer… - disse ele entrando novamente no seu Mercedes. – Vemo-nos por aí!
Dei por fim um “txau” para ele. Provavelmente nunca mais o viria…
Ficamos em silêncio vendo o carro a desaparecer pelo outro lado da rua.
- Podemos voltar para dentro do carro? – Pergunta Charlie tiritando de frio.
Nem me dei mais conta que estavam apenas alguns graus positivos. Voltamos para dentro do carro, estava bem mais agradável lá. Silêncio absoluto. Não sabia o que dizer nem o que pensar. Mesmo sabendo que as probabilidades de encontrar alguém ali naquelas horas absurdas fossem muito baixas, eu vi o Edge! Eu acabei de ver o Edge e tirei uma foto com ele! Bem, isto é espantoso!
- Cambada, vamos voltar? – Pergunta Tom olhando para nós.
Elas consentiram. Tom pôs o carro a trabalhar e fez a manobra contrária. Eu, as minhas amigas e o nosso companheiro irlandês regressaríamos juntos para a baixa de Dublin naquele momento se não fosse eu a impedir. Estávamos prestes a rolar pela estrada fora quando de súbito senti uma ponta de saudades daquele lugar.
- E se voltássemos?
- O quê? Joanne… acorda para a vida!! Nós estamos a voltar! – Exclama Natasha.
- Não, eu estou a falar em voltarmos para os estúdios!
- Para quê?
- Para ficarmos lá à espera… pode ser que…
- Não… se calhar seria boa ideia se fossemos só amanha… o Tom têm coisas marcadas agora e tudo! E os estúdios não são o único sítio onde podes encontra-los! – Diz Charlie virando a cabeça para mim.
- Não meninas! Eu quero ir agora. Tom pára o carro por favor… eu vou, com ou sem vocês! - Eu estava decidida. Este foi um dos momentos em que agi sem pensar… Tom obedeceu, sem pronunciar nenhuma palavra. Abri a porta e voltei-me para as minhas amigas. – Vêm?
- E depois como voltamos para casa? – Pergunta Charlie.
- Ah… sei lá! Arrumamos uma ideia qualquer, vá lá! – Implorei.
- Acho que consigo dar um jeito de vos ir buscar, mais tarde. – Pronuncia Tom.
Sorri esperançosa, olhei para Charlie e para Natasha.
- Estás a ser muito gentil connosco Tom, obrigada! – Diz Charlie abrindo a porta. – Até logo!
Natasha torceu o nariz com desagrado e saiu também seguindo-nos pela noite fria de Dublin. Eu e Charlie regressávamos lado a lado em silêncio enquanto ela vinha um pouco mais atrás a protestar murmurando entre dentes.
Charlie e Natasha sentaram-se num banco junto ao edifício da banda enquanto eu percorria a lanterna do meu telemóvel pelas paredes tentando ler as mensagens deixadas lá pelos fãs.

Tinham-se passado cerca de 30 minutos quando vimos outro carro. Natasha nem se mexeu do sítio onde estava, apenas revirou os olhos na nossa direcção enquanto eu e Charlie nos aproximávamos. O meu sangue gelou quando o sujeito lá dentro nos abriu o vidro. Estávamos muito perto dele quando reparou em nós e tentou ser simpático dando-nos um sorriso.
- Olá! – Charlie acenou-lhe contente. Eu estava paralisada.
- Olá, tudo bem? Como está? – Perguntei-lhe. Era a primeira vez que falava isto, credo, soou-me tão patético! Estou a falar com o Adam Clayton e faço esta pergunta estúpida? Como se ele fosse desabafar alguma coisa comigo como velhos amigos!
- Estou bem! – Respondeu incrivelmente bem disposto.
- Teve um grande dia? – Pergunta Charlie metendo mais conversa. Olhei para ela.
- É, muito grande sim. – Respondeu ele revirando os olhos. – Estão aqui à muito tempo? – Ele agora saía do carro. Era muito elegante... Fazia lembrar um lorde inglês! Vestia um casaco de camurça comprido.
- Algum! – Respondi. – O pior para estar aqui à espera é o frio… Hum, Adam, será que podemos tirar uma foto juntos? – As pernas tremiam-me. Bolas, que coisa terrível, os nervos são sempre a parte pior!!
- Claro! – Respondeu ele sorrindo.
Neste momento aparece Natasha. Olhava tão espantada como eu. Bom, eu confesso que elas não estavam tão esperançosas em encontrar mais alguém aqui como eu estava, mas no fundo ficamos as três boquiabertas! Quem não ficava, não é?
- Natasha, podes tirar-nos uma foto? – Perguntei eu dando-lhe a máquina.
Subimos todos para o passeio. Adam ficou entre nós duas, abraçando-nos.
- Vocês estão mesmo geladas! – Exclama ele olhando para nós. – De onde é que vocês vieram?
- Portugal. – Responde Charlie.
- Bom, é bastante mais quente do que aqui, isso é certo!
- Sim, o frio aqui é muito mais… húmido! – Húmido??? Oh, Joanne, mata-te!
- É, acredito que sim!
Natasha tira a fotografia e Adam começa a afastar-se de nós em direcção ao carro.
- Muito obrigada! – Disse eu.
- De nada!

Falar com Adam foi algo… mágico! Ele é tão simpático e atencioso! A única parte má foi o assunto da nossa conversa… tive a oportunidade de lhe dizer algo de interessante e ficamos a falar do tempo dos diferentes lugares da Europa! Enfim…

Alguns minutos mais tarde vimos alguém a sair dos estúdios. Ficamos no mesmo sítio, do outro lado da rua, a ver. A luz ali era fraca mas eu reconheci-o. Larry vinha a falar ao telemóvel distraído, parando no passeio a pouco metros de nós. Ficamos um pouco intimidadas, e não tínhamos a certeza se ele nos tinha visto ainda. Olhamos umas para as outras esperando que ele terminasse a conversa e viesse ter connosco. E eu começava a desconfiar seriamente da minha sorte! O que mais iria acontecer naquela noite?
- Ai… tinhas razão Joanne! – Exclama Natasha. – O Larry é mesmo bom!!
Natasha olhava maravilhada para ele. Bom, e eu a pensar que ela me ia dizer: “Uau, estavas certa! Conseguiste o que querias e ainda vais ter uma foto do Larry!!” Mas isso vindo daquela boca… era no mínimo estranho! Mas ao menos já não estava mal humorada por não ter ido com o Tom.
Ficamos uns 20 segundos muito compridos e finalmente ele terminou a ligação. Olhou para nós e disse falando do outro lado da estrada.
- Tudo bem aí?
- Sim. – Respondemos. Natasha quase caía sobre Charlie.
- É tarde, vocês estão aí há muito tempo? – Pergunta ele afastando-se cada vez mais.
- Sim, mas está um pouco frio. – Disse eu.
- O quê? – Pergunta Larry sem perceber. Pareceu-me um pouco distraído.
- Eu disse que estava um pouco frio! – Repeti. Só me apetecia agora esborrachar a minha cabeça na parede. Mas que fixação estúpida pelo tempo…!
- O que é que está frio? – pergunta ele rindo-se.
Meu deus, que desastre! Nós nem tivemos tempo de dizer mais nada. Larry voltou a entrar lá para dentro.
Natasha olhou-me com desagrado enquanto Charlie olhava para os sapatos sem dizer nada.
- Enfim, eu acho que vou ligar ao Tom para nos vir buscar. – Disse Natasha.
Eu continuava a olhar para a entrada do estúdio. Larry deixara a porta aberta. Será que mais alguém sairia de lá?
- Calma. Vamos esperar mais um pouco.

Mais 10 minutos e vimos Edge a sair apressado. O seu carro estava estacionado ao fundo da rua, por isso nem reparamos que ele tinha voltado. Talvez o tenha feito enquanto estávamos no carro do Tom e viemos. Aquele movimento era suspeito ali, mas eu estava imensamente feliz. Ele nem nos viu, mas nem sequer nos aproximamos… já tínhamos tirado uma foto à pouco tempo! Já seria abusar.

Um Mercedes preto e brilhante parou mesmo à nossa frente. Já não vimos mais ninguém a sair ou entrar em 30 minutos. Foi então que me passou pela cabeça algo que fez o meu estômago contorcer-se. Adam havia saído há algum tempo, Edge também e o Larry estava ainda dentro do edifício. Só podia ser outra pessoa… Só podia ser o Bono!
Charlie aproximou-se devagar. A porta do lado direito abriu-se. Estava virada para o outro lado mas num instante deu para ver alguém a sair.
Percebia-se que não era muito alto. Já na outra ocasião me apercebi muito bem disso. Tinha os cabelos penteados para trás, embora um pouco desalinhados, e uns óculos escuros postos, não deu para perceber de que cor eram, mas eu sabia. Bono olhou meio alheio à sua volta e viu-nos.
- Hey! – Disse ele sorrindo levemente e acenando com a mão dentro da manga da jaqueta. Meu deus… Ainda vou ter um ataque cardíaco por causa do raio do homem!
Entrou nos estúdios. Surpreendeu-me pelo facto de nem sequer ter trancado o carro… será que ele confiava assim tanto em nós? Esperamos um pouco sem saber o que fazer até que ele aparece de novo. Estava tão diferente! Digo eu, desde o nosso momento na passerelle da Elevation tour! O cabelo encontrava-se visivelmente mais claro, quero eu dizer que estava castanho… e um pouco mais comprido. O estilo do Bono muda a cada época, é compreensível, o estilo musical dos U2 também mudou ligeiramente com o novo álbum. Também trocou o género de óculos para uns levemente menos arredondados que os anteriores. E ficavam-lhe tão bem!
Antes de voltar a entrar no carro perguntou-nos lá do outro lado.
- Para onde vão? – A sua voz fora abafada pelo meu nervosismo.
- Desculpe? – Perguntei eu atravessando a rua, tremendo.
- Para onde vão? – Repetiu Bono. Se acham que o sotaque do Tom me deixa maravilhada então deviam de me ver agora!
- Agora? – Perguntei. Mais perto.
- Yeah!
- Hum… Para a baixa. – Quase a ter um ataque. Devem de estar a perguntar-vos: “O raio da moça não pode ser tão tímida assim… ela enroscou-se no Bono a meio de um concerto, como pode ela estar a ter tantos problemas em falar com ele?” Pois meus queridos, eis a resposta: Não sei!
- Querem boleia?
Parei.
Boleia? Logo tu? Claro! Meninas, agarrem nas vossas coisas, let’s go! O que mais queria eu naquele momento? Tirei foto com o Edge, conversei com o Adam e vi o Larry… isto acabaria com uma boleia do Bono? Claro, porque não?
Na verdade, eu estava era aterrorizada. Fiquei parada a ver a sua cara de: “Então, queres ou não, ‘honey’?” Sorriu.
- Hã.. Bom… se não se importar…
Natasha riu-se e andou em direcção ao carro abrindo a porta traseira.
- Não me parece! – Responde ele entrando no carro.
- Vamos? – Perguntou Charlie pegando-me pelo braço.
Natasha entrou e encostou-se lá para o fundo, Charlie estava atrás de mim quando me impediu de entrar atrás dela.
- Não, tu és a fã do Bono, tu vais à frente! – Disse ela baixinho.
- Hã, e se ele não quiser ninguém à…
Charlie entrou na parte de trás e fechou-me a porta antes de terminar de falar. Lá fui eu com um ataque de taquicardia a aproximar-se.
Abri a porta. A primeira coisa que vi foram papéis espalhados pelo banco mas Bono apressou-se a tira-los de lá atirando-os para outro sítio qualquer. Passou mais uma vez a mão nos estofes limpando migalhas e coisas do género. Ufa… finalmente entrei. Pronto, aqui estou eu, mesmo sentada ao seu lado! Nem acredito. Coloquei o sinto de segurança ainda sem olhar para o lado. Assim estou mais segura.. pensei. Que estupidez… segura ao lado do Bono? Nunca! Estava quente lá dentro e reconheci muito bem aquele cheiro, acho que na verdade nunca o esqueci.
O automóvel era muito bonito por dentro. Os estofes eram beges e todo o resto também. Não estava muito desarrumado, excepto a pequena ‘lixeira’ que se amontoava aos seus pés e no tablier. Isso sim, era de esperar.
- Fui o último a chegar? – Perguntou Bono pondo o carro a trabalhar.
- Sim! – Respondemos nós.
Tinha uma fé que ele reparasse melhor em mim e me reconhecesse, mas começava já a desconfiar que isso acontecesse. Depois de muitas outras raparigas como é que ele se ia lembrar? Bom, agora fiquei um pouco desapontada e desconfiada acerca dos seus caprichos em cima do palco. Eu sonhei todas as noites com aquele episódio e ele sonhou com certeza com o “próximo ataque”! Que lindo… Eu não posso ser tão egoísta assim, pois não?
- Vêm de onde? Espanha? – Pergunta ele olhando para mim. Tenho cara de espanhola? Olhos de espanhola[1], talvez seja um bom sinal isso! Ou então… será que ele se lembra da cena em Barcelona?
- Não… Portugal, Porto. – Respondi eu.
- Hum… Portugal, sim. É um sítio encantador. É um país que fica “plantado” à beira mar totalmente desprendido do resto da Europa… – Disse ele com um certo brilho nos olhos.
- Excepto de Espanha! – Disse Natasha lá atrás.
Bono riu-se. – Sim, isso é verdade!
Enquanto ele dirigia em sentido contrário numa via de sentido único, Natasha e Charlie cochichavam e davam risadas. Bono conduzia com vontade cantarolando algo que também não percebi bem o que era.
Havia uma coisa que eu desejava dizer-lhe mas tinha de ganhar coragem suficiente. Não sabia o que ele iria dizer ou pensar acerca disso… Por isso fiquei ainda mais desejosa de falar.
- Na verdade… nós já nos conhecemos antes.
Bono fez-me um sorriso realmente grande! Meu Deus, ele lembra-se?
- A sério? – Pergunta ele olhando para mim.
Oh, não, ele não se lembra… Vou-me atirar duma ponte quando saír daqui!!
- Yeah, no concerto em Barcelona, durante The Fly, você puxou-me para o palco juntamente consigo e bem, literalmente rolamos pelo chão. – Bingo!
Bono olhou em frente envergonhado e um pouco embaraçado com o que eu acabei de dizer. Natasha e Charlie riam-se baixinho.
- Hãm… - Meu Deus! Bono completamente intimidado por mim! Que amoroso! Oh Yeah! – Sabes, eu fico completamente fora de mim naquela música. Durante essas alturas provavelmente eu vejo alguém particularmente intenso ou especial e que me chame à atenção e simplesmente puxo essa pessoa para o palco… Peço desculpa.
- Não… não se desculpe! – Disse eu imediatamente olhando para ele. Não, ‘babe’, não peças desculpas… foi tão espectacular termos simulado sexo à frente de todos!
- Não admira que me tenhas parecido familiar… Espero que não tenhas sentido como se te apontassem uma arma à cabeça!
- Não se preocupe, a sério! – Insisti eu rindo-me. Oh, vá lá… Teve piada! Mas eu não senti isso, meu amor, senti precisamente como se estivesse a ser passada a ferro por um camião tire! Mas definitivamente, aquilo foi louco demais!
Bono Olhou para mim e riu-se também, como se me estivesse a ler os pensamentos.
- Todas vocês andam na Universidade?
- Sim – Respondemos.
- Faculdade de Letras da Universidade do Porto. – Disse Charlie. Como se ele fosse conhecer…
- Hum… Óptimo!
Parámos num semáforo. Havia bastante movimento na baixa de Dublin. As luzes dos candeeiros de rua iluminavam tudo com uma luz amarelada. Estava uma noite límpida e sem vestígios de chuva, o que era de admirar. A lua fazia-se brilhar lá no cimo e acho que era impossível não reparar nela. Ainda me sinto como se estivesse num sonho… o Bono está ao meu lado! Belisquem-me!
- Onde é que vocês estão hospedadas? – Pergunta ele quebrando o silêncio. Arrancamos de novo.
- Bom, nós esta noite ficamos na casa de um amigo nosso, mas depois ficaremos hospedadas em Clontarf, Clontarf Castel.
- Clontarf? Oh, eu adoro essa zona! – Disse Bono sorrindo brandamente. – Usava-a para ir para a escola…
- A sério?
- Yeah, eu costumava baldar-me às aulas com os meus amigos e lá tínhamos sempre sítio para onde ir.
Bono tirou os olhos da estrada por uns momentos e procurou por algo no rádio do carro. – Quero-vos mostrar uma coisa! – Disse ele. Pensei imediatamente que fosse alguma nova música dos U2.
- Não consigo encontrar a ‘magazine’[2]! – Disse Bono.
- Magazine?
- Sim, magazine é um tipo de cassete em que tu pões e ouves as gravações… sabes?
- Hum… sim. – Respondi eu sem perceber patavina.
Chegamos a um sítio onde muita gente se amontoava junto a pubs e discotecas. Era um sítio bastante agradável à primeira vista. Mas havia muito movimento na estrada e o estacionamento estava esgotado.
- Bom, aqui há um monte de sítios divertidos onde podem ir. Grafton Street está bastante complicado agora… - diz ele coçando o queixo confuso. – Por isso, podem andar por Stephen's Green, e… Temple Bar também é simplesmente fantástico.
Encontramos um pequeno espaço onde Bono estacionou. Tudo ficou escuro à nossa volta quando os faróis do carro se desligaram. Bono tentou ligar a luz de presença às apalpadelas pelo tecto. Eu só conseguia ouvir o meu coração a bater a mil à hora. Que momento mais surreal… às escuras num carro com Bono! Por fim, fez-se luz mesmo por cima das nossas cabeças. Eu estava prestes a libertar-me do sinto de segurança quando Bono me encarou de frente.
- Então…? – Disse ele. Estendeu-me a mão e fez um sorriso meio estabalhoado. Não era muito diferente das fotos, mas havia qualquer coisa no olhar e no sorriso que me deixava arrepiada. Uau… como ele é tão simples e tão atraente ao mesmo tempo! O Bono simplesmente não existe, pessoal! E num momento íntimo como este, dá para se perceber muito mais acerca dele!
Olhei confusa. Não sabia o que ele queria, na verdade…
- Como te chamas? – Pergunta ele pegando na minha máquina fotográfica.
- Joanne.
- Podes tirar-me uma fotografia a mim e à Joanne? – Pergunta Bono a Charlie.
- Claro! – Responde ela.
- Calma, isso precisa de flash, primeiro. – Disse eu.
Bono olha confuso para a máquina o que me fez realmente rir. – Eu ajudo!
Com o Flash pronto Charlie mirava-nos na foto. Bono passou o braço à minha volta e ficamos justamente colados, lado a lado. Eu só sabia o quanto era maravilhoso ouvi-lo pronunciar o meu nome! Ai credo… como é difícil escrever isto! Charlie entregou a máquina e Bono tirou uma ‘fotozinha’ às duas também, que simpático!
Enquanto ele me devolvia a máquina sorrindo passou-me uma coisa pela cabeça. A coisa mais parva, absurda, impossível e aliciante à face da terra, mais do que eu podia imaginar.
- Bono, posso pedir-lhe uma coisa?
As minhas amigas olharam curiosas para mim. E ele também.
- Sim?!
- Posso ter direito a um beijo?
Tudo parou para mim naquele momento. Os segundos pareceram horas! Este foi o momento em que eu fiquei naquela expectativa e ao mesmo tempo a desejar lançar-me para as masmorras por ter tentado esticar demasiado a minha sorte. Natasha olhava chocada para mim e reparei que Charlie lhe piscava o olho. Olhei para Bono. Ele deu uma risada perversa enquanto se soltava do cinto.
- Com certeza, Joanne! – Não, isto não foi outro pensamento dos meus! Agora poderia dizer que Bono estava tão nervoso como eu, mas não era verdade de jeito nenhum! Eu não sabia o que fazer, mas ele mostrou-me o caminho!
Por esta altura penso que os seus braços já se enrolavam em mim e num ápice senti os seus lábios encostados nos meus. Tremi um pouco mas pensei o quão ele foi eficaz nisto. Mantive os olhos fechados mas o meu desejo era abri-los e certificar-me que não era imaginação minha! Por esta altura ele tinha o lábio inferior literalmente dentro da minha boca! Que circunstâncias tão comprometedoras para uma fã estar com o seu ídolo! Bono mudou de posição beijando-me com mais fervor e eu pude sentir as nossas bocas ficando cada vez mais quentes. Bom, com muita pena minha, tenho a dizer que terminamos a sessão sem que as nossas línguas tivessem um papel principal… Que se dane! What a Fucking Kiss!! Experimentem ficar com a boca enconstada noutra durante 10 segundos, e eu recomendo Bono!
Abri os olhos, ainda meia atordoada. Ele ainda estava bem na minha frente.
- ‘Wooow’… Agora lembrar-me-ei de ti! – Sussurra ele ainda de olhos fechados. Preciso agora daquele ‘smiley’ com os olhos a cintilar, porque era assim que eu estava no momento em que ele me largou por fim.
Bono recompôs-se. Eu não consegui fazê-lo na totalidade, estou certa. Ouvi Charlie e Natasha a prepararem-se para deixarem o carro. Charlie abriu-me a porta. Tentei saír mas Bono impediu-me puxando o meu braço e fazendo-me sentar de novo no banco. Olhou-me com aquele olhar meio esgazeado meio consciente e tornou a repetir um: ‘Wooow’ seguido de um sorriso enorme.
- Adeus. – Disse eu. Este foi o momento em que tentei captar a última imagem dele antes de saír.
Será que nos voltaríamos a ver?

Fim (ou não…)


[1] Olhos de espanhola (Spanish Eyes) – Nome de uma música do álbum The Joshua Tree dedicada à sua esposa pela sua aparência latina, principalmente os olhos castanhos.
[2] Magazine – Neste caso tem duplo significado, mas traduzido à letra quer dizer “revista”.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

I Will Follow

Queridos leitores,

A partir do título do nosso blog, já têm uma pequena noção do que vai ser aqui tratado. Histórias. Histórias fictícias. Com que tema?, perguntam vocês. O título do nosso blog não vos lembra mais nada? Se forem realmente fãs, lembrar-se-ão. Sim, sim! É o título do primeiro capítulo do livro "Bono por Bono". Aí têm o tema: os U2.
Vamos, postar uma história por cada post. Uma muito pequena, apenas um acontecimento na vida de uma personagem.

Esperemos que se divirtam, e que à medida que lêm sugiram ideias novas, para assim interagirmos com vocês.

Tudo de Bono,
Charlie & Joanne